05 de março de 2025
Minha Paz
Minha Paz
Não há, minha paz, a habitar na clareza. Ela se dissolve na névoa das minhas certezas frágeis, aninha-se na confiança que cultivo entre trincheiras ásperas do meu corpo. Acendo uma chama olhando para dentro, como quem procura um reflexo que nunca vem. E tento ver o mundo com olhos alheios, mas falho — minha visão é só minha, feita de matizes que ninguém mais enxerga. O vento sussurra promessas de alegria, e eu me pergunto se algum dia ele soprou para mim com a mesma fúria com que dança entre as pétalas dos outros. Há dias em que meus olhos são surdos para as cores que todos parecem ver com tanta facilidade, e, noutros, as cores me visitam, bastando-se à tapeçaria do que sou. Não há mapa ou roteiro que dite a minha estrada, e, se há uma bússola, seus ponteiros sempre oscilaram, errantes, como se tivessem medo de apontar um norte. A construção do acaso. Sou grão de areia sem rédeas e sem rumo. Tenho liberdade nisso. Um certo alívio oculto na solidão inevitável. Não caminho sozinho nesse deserto e, por mais amarga que seja a taça que nos cabe, repousa nela uma lição rara ou uma ilusão de verdade. Não tenho a euforia alheia sobre a posse da minha alegria, porque o que é meu a minha pele sente e meus olhos veem, e a cor mais bela que me apetece é essa mesma cor. O som que ouço, o mesmo do meu silêncio, também é o som mais agradável. O meu caminho. A minha trilha. Percorro livre de promessas.